
A primeira pessoa escolhida para tomar a Coronavac, vacina desenvolvida pela chinesa Sinovac em parceria, no Brasil, com o Instituto Butantan, é Mônica Calazans, de 54 anos. Ela é mulher, negra e enfermeira. As informações são de Monica Bergamo, da Folha de S.Paulo.
Ela receberá a CoronaVac, vacina produzida pelo Instituto Butantan, em ato simbólico. Enfermeira do hospital Emílio Ribas, Mônica é integrante do grupo de risco da covid-19, ela é obesa, hipertensa e diabética.
Mônica mora em Itaquera, na zona leste da capital paulista, e trabalha na UTI em dias alternados, em escalas de 12 horas. O setor tem 60 leitos exclusivos para pacientes de Covid-19.
A enfermeira trabalhou como auxiliar de enfermagem por 26 anos e decidiu fazer faculdade numa fase já madura, se formando aos 47 anos.
O que é a CoronaVac?
A CoronaVac é uma vacina contra a Covid-19 que funciona a partir da utilização de vírus expostos a uma técnica que os coloca em exposição ao calor e produtos químicos para que eles não sejam capazes de evoluir. Não existe presença do vírus Sars-Cov-2 vivo na solução e, por isso, os riscos desse tipo de imunizante são menores.
Qual foi a eficácia da CoronaVac? O que isso significa?
A CoronaVac atingiu uma eficácia global de 50,38%.
Este dado não havia sido revelado até então. Na prática, ele significa que quem for imunizado tem 50,38% de chance de não ser infectado pela Covid-19.
O índice mínimo recomendado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) e pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para aprovação é 50%.
A taxa de eficácia representa a proporção de redução de casos entre o grupo vacinado comparado com o grupo não vacinado.
Para o Butantan obter esse dado, foi preciso analisar o número de casos entre os voluntários que receberam a CoronaVac e comparar com o número de infectados no grupo que recebeu um placebo — uma substância salina sem efeito no organismo.
Foram 9.242 voluntários ao todo: 4.653 receberam a CoronaVac, e outros 4.599 receberam o placebo.
Durante os testes, o grupo da vacina apresentou 85 infecções por Covid-19, correspondendo a 1,8% (85 infectados / 4.653 voluntários).
Enquanto isso, o grupo da substância salina manifestou 167 casos positivos, equivalendo a 3,6% (167 casos / 4.599 voluntários).
Portanto, ao confrontar os percentuais, chega-se ao patamar de 50,38%.
Por que a eficácia da CoronaVac foi menor no Brasil do que em outros países?
Esse ponto foi fortemente comentado pelos diretores do Butantan durante a coletiva.
Testada também em outros países além do Brasil, a CoronaVac apresentou uma eficácia global de 91,25% na Turquia, e de 65,3% na Indonésia.
A explicação para a diferença, segundo o Butantan, está no grupo selecionado para servir como voluntários. No Brasil, apenas profissionais de saúde puderam se inscrever para os testes da CoronaVac, tanto para o grupo do placebo quanto para o da vacina.
Na coletiva, Palacios explicou que a seleção dos profissionais de saúde foi proposital visto que essa população está muito mais exposta ao vírus do que outras pessoas no geral.
“O teste não é a vida real exatamente. É um teste artificial, no qual selecionamos dentro das populações possíveis, selecionamos aquela população que a vacina poderia ser testada com a barra mais alta”, afirmou Palacios. “Fizemos deliberadamente para colocar o teste mais difícil para essa vacina, porque se a vacina resistir a esse teste, iria se comportar infinitamente melhor em níveis comunitários”, completou.
O presidente do Butantan, Dimas Covas, estima que a chance de infecção nos profissionais de saúde chega a ser 5 vezes maior do que em outras classes.
Portanto, quanto mais exposta à Covid-19 está a população, mais ela tem chance de ser contaminada e, consequentemente, menor será o percentual da eficácia do teste.
Outro ponto destacado por Covas na coletiva foi o parâmetro adotado pelo Butantan para considerar a definição de caso positivo de Covid-19. Os voluntários que apresentassem os seguintes sintomas por 2 dias ou mais eram selecionados para fazer o teste de RT-PCR:
Febre ou calafrios; tosse; falta de ar; fadiga; dor muscular; dor de cabeça; perda do olfato e paladar; dor de garganta; coriza; náusea; ou diarreia.
Na avaliação de Dimas Covas, o mesmo critério para submeter o voluntário ao teste não foi adotado por outros estudos clínicos.
Como comparar a eficácia da CoronaVac com as outras vacinas?
O anúncio de um percentual pouco acima dos 50% mínimos pode levantar uma desconfiança quanto à segurança e eficácia da CoronaVac na comparação com as demais vacinas pelo mundo.
Os pesquisadores alertam, no entanto, para a imprecisão que se obtém ao comparar dois estudos diferentes.
“A gente quer comparar os diferentes estudos, mas é o mesmo que comparar uma pessoa que faz uma corrida de 1km em um trecho plano e uma pessoa que faz uma corrida de 1 km em um trecho íngreme e cheio de obstáculos”, relatou Palacios, diretor do Butantan.
Os 50,38% são abaixo dos dados acima de 90% de eficácia divulgados, por exemplo, pelas vacinas que utilizam a nova tecnologia de RNA, na qual material genético é usado para levar proteína estimulante do sistema imune ao paciente.
Contudo, a “lupa” também parece ser maior no estudo do Butantan, enquanto os demais testes também apresentaram dados que estão sendo contestados.
No caso da vacina da Pfizer-BioNTech, com 95% de eficácia geral, houve 162 infectados com Covid-19 entre quem tomou placebo e apenas 8 entre vacinados, entre 44 mil voluntários.
Só que o relatório da FDA, agência reguladora dos Estados Unidos, aponta a exclusão de 3.410 pessoas que sofreram sintomas de Covid-19, mas não foram testados. Desses casos suspeitos, 1.594 faziam parte do grupo vacinado e 1.816, do que recebeu placebo.
A discrepância foi ressaltada em postagem de Peter Doshi, editor associado do prestigioso British Medical Journal.
A diferença entre as duas publicações é que a Pfizer fez uma exposição detalhada de seus dados, enquanto o Butantan alega que é preciso esperar a análise da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para tornar público um relatório com mais de 10 mil páginas.
CoronaVac: quantas doses serão produzidas para o Brasil?
Não se tem um número preciso de quantas doses da CoronaVac estarão disponíveis para o Brasil. Em setembro de 2020, o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), afirmou que receberia 46 milhões de doses após pagamento de US$ 90 milhões.
O número não é preciso, no entanto, porque não se sabe se o acordo citado pelo governador paulista envolve ou não os R$ 85 milhões que o governo de São Paulo afirmou, em junho de 2020, ter pago ao laboratório.
Os dois acordos não foram divulgados na íntegra para a imprensa e o grande público.