
Após sobreviver na pandemia, com aberturas e fechamentos durante quase dois anos, Capitólio, no Sul de Minas, convive mais uma vez com a dúvida: para quem ganha dinheiro com o “Mar de Minas” quais serão os impactos da tragédia nos cânions, que teve dez mortes em 8 de janeiro deste ano, após uma rocha ter despencado sobre uma lancha? A reportagem conversou com empresários de diferentes setores da cidade, que tem o turismo como principal atividade econômica, para entender as projeções para os próximos meses.
As opiniões divergem em alguns pontos, mas a maioria dos empresários do turismo de Capitólio acha que haverá uma implicação temporária, por algumas semanas. Todos os ouvidos pela reportagem, no entanto, são categóricos ao cobrar mais fiscalização e um estudo das autoridades sobre a região dos cânions para evitar novos acidentes. As atividades em todo o lago de Furnas seguem suspensas por tempo indeterminado, para avaliação do risco geológico da região, afetado por fortes chuvas nas últimas semanas.
“Todo mundo vem aqui esperando alegria e não estamos tendo (no momento). Espero que o comércio, após finalizar a investigação da Polícia Civil e dos geólogos, não sofra tanto. Já passamos por dois anos muito complicados. Janeiro, normalmente, é o melhor mês. Provavelmente, vai ter um impacto, infelizmente”, avalia Talita Rodrigues Ferreira, de 36 anos, proprietária do Restaurante Central, um dos mais tradicionais negócios do município. A família, que está há 40 anos no comércio da cidade, hoje depende do turismo. “A cidade, por ser pequena, está com toda a população em luto”, acrescentou.
Proprietária de um camping e uma pousada em Capitólio, Maria Perpétua da Costa, de 61 anos, já viu os prejuízos da tragédia. Ela trabalha ao lado do filho Guilherme, proprietário de uma das lanchas destruídas pelo impacto da pedra. No negócio da família, o turista encontra desde hospedagem até passeios. “Ele perdeu R$ 300 mil. Está chocado e quer parar de trabalhar com isso (passeios náuticos)”, lamenta. Para Perpétua, o impacto do acidente não deve durar muito tempo, já que o turismo no lago de Furnas está consolidado.
“Acredito que não será não será prolongado. Mas também tivemos as chuvas, que destruíram muitas estradas”, avalia. A empresária lembra ainda que sempre se preocupou com a situação dos cânions e a possibilidade de eventuais deslizamentos. “Muito antes de o turismo crescer na região, eu trabalhava para um empresário em Escarpas, e a gente fazia passeio de lancha. Eu falava com ele: ‘olha, aquela rocha ali está meio solta. Pode cair’”, recorda.
Expectativa frustrada
E o fato de a maioria dos negócios ainda se recuperar dos efeitos da pandemia fez com que muitos empresários apostassem em janeiro para reerguer seus negócios. Nesse cenário, a tragédia justamente no início do mês atrapalhou os planos. O ramo de passeios, por exemplo, depende 100% da procura dos turistas.
“Eu trabalho com esses roteiros aqui nas cachoeiras há quatro anos. Creio que esse impacto vai afetar no início, mas, daqui a pouc,o está tudo normal de novo. Nas pedreiras, é preciso uma vistoria permanente”, diz Daniel Orelhio Carvalho, de 59 anos, que oferece um tour pelas belezas de Capitólio por meio de um veículo 4×4. Esse tipo de atração tem dominado o turismo na cidade, ao lado das lanchas.
Principal atividade econômica
Com cerca de 8.000 habitantes, o município chega a receber mais de 4.000 turistas nos finais de semana, número que pode ultrapassar até 20 mil durante os feriados prolongados. Diante de dados tão expressivos, o turismo tornou-se a principal atividade econômica em Capitólio e, segundo a prefeitura, já representa 65% do Produto Interno Bruto (PIB). Ao todo, são mais de 20 hotéis e pousadas, além de campings e centenas de residências para aluguel por temporada.
Redes sociais são aposta para retomada
O lago de Furnas passa por 34 cidades mineiras, a maioria na região Sul do estado. Vice-presidente da Associação dos Prestadores de Serviços Turísticos de Capitólio e Região (Astur) e empresário do turismo, Paulo César Santos analisa que a atividade deve ter queda nas próximas semanas. “Obviamente que a atividade turística vai cair bem sim, não só para Capitólio, mas para toda a região. As pessoas ficam com um pouco de receio. Creio que após a análise do local do acontecido, e ver que temos segurança nos pontos turísticos, vamos dar a volta por cima”, analisa.
Relativamente recente, o turismo se tornou vocação na região há menos de dez anos, principalmente com as atrações nas lanchas e SUVs. Nesse processo, os comerciantes estão seguros de que o advento das redes sociais se tornou o grande trampolim para essa atividade econômica. E serão justamente elas a aposta para a recuperação após a tragédia.
“Há alguns anos, todo mundo vinha aqui por causa de Escarpas. Agora, quem vem para ver mansão? As pessoas começaram a vir mais por causa do lago e dos passeios, a partir (do compartilhamento) das redes. Os cânions vão fazer falta, mas Capitólio tem mais de 20 cachoeiras”, avalia Renaldo Alves, de 71 anos, proprietário da Casa do Artesanato.
Com precauções, impacto será ameno
Como Capitólio está a cerca de quatro horas de BH e a seis de São Paulo, muita gente vai visitar o “Mar de Minas” de carro. Em datas de muito movimento, a oferta de hospedagem fica apertada, o que força muita gente a procurar opções mais baratas nos municípios próximos. É o caso de Piumhi, que fica a menos de meia hora de Capitólio. O gasto com pedágio – R$ 6,80 por trecho – compensa.
Dono do Stalo Hotel, Thiago dos Reis Melo, 38, afirma que 60% dos turistas que recebe estão em busca de visitar Capitólio.
“Realmente, os turistas podem ficar um pouco desconfortáveis com o que aconteceu. Mas a gente acredita que, voltando o tempo de sol, com as devidas precauções das autoridades, o turismo vai ser impactado de forma bem amena”, avalia o empresário.
Os reflexos da tragédia são amenizados porque o hotel recebe turistas que desejam conhecer a serra da Canastra – os outros 40% dos hóspedes.
Via: O Tempo.