Jornal Folha Regional

MG lidera lista suja do trabalho escravo no Brasil com 21% dos empregadores

MG lidera lista suja do trabalho escravo no Brasil com 21% dos empregadores - Foto: reprodução
MG lidera lista suja do trabalho escravo no Brasil com 21% dos empregadores – Foto: reprodução

Minas Gerais segue como o Estado com mais empregadores que submeteram trabalhadores a condições análogas à escravidão. Conforme a “Lista Suja”, levantamento realizado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) e divulgado nesta quarta-feira (9), 159 dos 745 nomes divulgados em todo o país estão no Estado, o que corresponde a 21% do total. No último balanço, divulgado em outubro de 2024, Minas também liderava o ranking com 165 dos 725 — ou seja, 22%.

“Considero que esses números refletem o trabalho que temos feito no Estado. Não acredito, por exemplo, que Minas tem mais empregadores que mantém os trabalhadores em condições análogas à escravidão que os estados do Amazonas, Bahia e Pará. Porém, mesmo com a eficiência do trabalho, os números mostram um cenário preocupante”, afirma o superintendente do Ministério do Trabalho em Minas Gerais, Carlos Calazans. Conforme o levantamento, 1.479 trabalhadores foram resgatados no Estado nos últimos meses.

A atualização é feita a cada seis meses e, segundo o MTE, tem o objetivo de “dar transparência às ações de combate ao trabalho escravo realizadas por auditores-fiscais do Trabalho”. Nesta nova atualização, 155 empregadores, entre pessoas físicas (patrões) e jurídicas (empresas), foram incluídos no cadastro em todo o país. Deste total, 15 em razão da comprovação de trabalho análogo à escravidão em atividades domésticas.

As atividades com maior número de inclusões nesta edição foram criação de bovinos (21), cultivo de café (20), trabalho doméstico (18), produção de carvão vegetal (10) e extração de minerais diversos (7). “Em Minas Gerais, 80% dos casos são na agricultura. Trabalhadores que estão em fazendas e sítios sem acesso à água, em condições degradantes, dormindo no chão e com jornadas exaustivas”, acrescenta o superintendente.

A Lista Suja

O Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores à condição análoga à de escravo, popularmente conhecido como “Lista Suja”, existe desde 2003. Segundo o MTE, depois que o nome do empregador é incluído no Cadastro, ele permanece publicado por dois anos, conforme portaria que regula a lista.
  
“A inclusão de pessoas físicas ou jurídicas no Cadastro de Empregadores só acontece após a conclusão do processo administrativo que analisou o auto de infração por trabalho análogo ao de escravo. Para que o nome seja incluído, é necessário que a autuação tenha sido considerada válida em decisão final, sem possibilidade de recurso”, disse o MTE.

Ainda segundo o MTE, 120 nomes que haviam completado o prazo de dois anos deixaram a lista no dia 4 de abril deste ano.

Como denunciar

As denúncias de trabalho escravo podem ser feitas no Sistema Ipê, plataforma lançada pela Secretaria de Inspeção do Trabalho, do MTE, em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 2020. Os relatos podem ser feitos de forma remota e sigilosa.

Cantor Leonardo é incluído pelo governo na ‘lista suja’ do trabalho escravo após fiscalização na fazenda Talismã

Cantor Leonardo é incluído pelo governo na 'lista suja' do trabalho escravo após fiscalização na fazenda Talismã - Foto: reprodução/redes sociais
Cantor Leonardo é incluído pelo governo na ‘lista suja’ do trabalho escravo após fiscalização na fazenda Talismã – Foto: reprodução/redes sociais

De acordo com informações do jornal O Globo, o nome do cantor Leonardo foi incluído, nesta segunda-feira (7), na “lista suja do trabalho escravo” divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Secretaria de Inspeção do Trabalho.

O documento, que é atualizado semestralmente, publica os dados de empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à escravidão. Foram 76 pessoas adicionadas à lista, que tem atualmente 727 nomes.

Isso ocorre após uma fiscalização realizada por técnicos do MTE em novembro de 2023 na Fazenda Talismã, em Jussara (GO), interior de Goiás. A propriedade de Leonardo (nome artístico para Emival Eterno da Costa) é avaliada em R$ 60 milhões e mantida e gerida pelo sertanejo. No local, seis pessoas, incluindo um adolescente de 17 anos, foram encontradas em “condições degradantes”, em situação que configura, de acordo com o ministério, a “escravidão contemporânea”.

Segundo o relatório do órgão, os seis funcionários pernoitavam em uma casa abandonada, sem água potável e sem banheiro e com camas improvisadas com tábuas de madeira e galões de agrotóxicos. O arquivo do MTE também indica que o lugar estava tomado por insetos e morcegos, além de exalar um “odor forte e fétido”.

O que diz Leonardo?

Procurada pelo g1, a assessoria do sertanejo disse que o caso foi julgado e se refere a uma parte da fazenda que estaria arrendada para uma pessoa que estaria realizando o plantio de soja. Acrescentou, ainda, que o cantor não tinha conhecimento das práticas de trabalho escravo.

A Fazenda Talismã, do cantor Leonardo, tem cerca de mil hectares e conta com criações de gado e cavalo. Também tem uma vasta estrutura de lazer para receber a família e os amigos, com quadras de vôlei e um lago que circunda a casa principal, onde é possível, inclusive, andar de jet ski. 

Minas Gerais lidera ranking de resgatados em situação análoga à escravidão no Brasil

Minas Gerais lidera ranking de resgatados em situação análoga à escravidão no Brasil – Foto: Divulgação / Ministério do Trabalho

Minas Gerais tem o maior número de pessoas submetidas ao trabalho análogo à escravidão. Só em agosto, dos 532 trabalhadores resgatados no país, 204 estavam em terras mineiras, o que representa um total de 40%. Os dados são do Ministério Público do Trabalho (MPT) e foram divulgados nesta quarta-feira (6).

Segundo a pasta, durante a Operação Resgate III, mais de 70 equipes de fiscalização participaram de 222 inspeções em 22 estados e no Distrito Federal. Foi constatado que cinco estados concentraram quase 90% desses resgates realizados em agosto, com Minas e Goiás no topo da lista. Em terceiro lugar está São Paulo.

Em MG, foram encontradas ilegalidades em áreas rurais e também urbanas. Dos resgatados, 97 estavam em lavouras de café, em oito municípios do estado. São eles: Itamogi, Cabo Verde Silvianópolis, Santa Rita do Itueto, Pratinha, Santa Rita do Sapucaí, São Pedro da União e Muzambinho.

Outras 97 trabalhavam descascando alho em Rio Paranaíba, na Região do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba.

Ministério do Trabalho resgata 16 trabalhadores por condições análogas à escravidão em fazendas do Sul de MG — Foto: Divulgação / Ministério do Trabalho
Ministério do Trabalho resgata 16 trabalhadores por condições análogas à escravidão em fazendas do Sul de MG — Foto: Divulgação / Ministério do Trabalho

Em Tapiraí, no Centro-Oeste de Minas, foram resgatadas 7 pessoas na produção de carvão. Já em Belo Horizonte, foram resgatadas duas pessoas na criação de animais e uma no trabalho doméstico.

De acordo com o MPT, os resgatados tiveram os custos trabalhistas regularizados e voltaram para seus locais de origem. Já os empregadores devem responder a processos judiciais e terão os nomes na lista suja do Ministério do Trabalho.

O que caracteriza o trabalho escravo?

Segundo Cynthia Saldanha, auditora fiscal do trabalho, o trabalho análogo à escravidão é definido pelo artigo 194 do Código Penal. Ele é caracterizado por:

📌 submissão de alguém a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva;

📌 condições degradantes de trabalho;

📌 cerceamento do uso de meios de transporte;

📌 servidão por dívidas;

📌 restrição de locomoção;

📌 vigilância ostensiva;

📌 apoderamento de documentos ou objetos pessoais.

“Diferentemente do período colonial, hoje as correntes não estão presentes visivelmente. Por exemplo, antes, as casas onde havia exploração de trabalho eram lugares inacessíveis. Hoje, a fiscalização consegue chegar a esses locais, e a gente consegue resgatar trabalhadores domésticos em condições análogas de escravo”, explicou Saldanha.

Como denunciar?

📌 Casos de trabalho análogo à escravidão podem ser denunciados por meio do Disque Direitos Humanos, ligando no número 100.

📌 As denúncias também podem ser feitas pelo site do Sistema Ipê. O denunciante não precisa se identificar.

Minas é a principal origem e destino do tráfico de pessoas para trabalho escravo

“A gente sai de longe em busca de uma melhoria para nossa família e acaba sendo enganado. Comigo eu não me preocupo, mas o que será das minhas crianças agora?”. A indagação é de Renato Alves Brito, de 31 anos, um trabalhador resgatado em julho deste ano em Ilicínea (MG), e que ainda luta na Justiça para receber alguma indenização após um grave acidente que o deixou incapaz de trabalhar. Ele e outros três colegas foram retirados de Porteirinha, na região Norte, e transportados por mais de 800 quilômetros para serem vítimas de trabalho análogo ao escravo por um grande fazendeiro na colheira de uma das muitas plantações de café que fazem do Estado o principal produtor da commodity no mundo.

Esse é o retrato de centenas de pessoas que são tiradas de suas cidades para serem vítimas de escravidão, longe de tudo, da família e, principalmente, da dignidade. Dados atualizados nesta semana pelo Ministério do Trabalho, no site Radar SIT – da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) – ilustram essa grave situação, já que Minas Gerais liderou o ranking tanto de origem como destino de vítimas do tráfico de pessoas para o trabalho escravo.

Segundo a última atualização, que apresentou os números nacionais de 2021, Minas foi a origem de 579 casos de trabalhadores traficados para atuar em condições degradantes. Para se ter ideia, o segundo colocado no ranking é o Maranhão, que foi a origem do tráfico em 249 dos casos, menos da metade dos registros em solo mineiro. Entretanto, ao mesmo tempo, o Estado também lidera como principal destino dos trabalhadores traficados em todo o país, com 61 destes registros. 

Ainda conforme a SIT, de todos os casos de tráfico de pessoas identificados, 53% são interestaduais, sendo que os dois municípios que mais foram origem são mineiros: São Francisco, no Norte do Estado, e Pompéu, na região Central. Ao mesmo tempo Minas ainda tem três municípios entre os cinco principais destinos de exploração de trabalhadores, sendo o primeiro colocado Coromandel e o terceiro Tapira, ambos no Alto Paranaíba. O quarto maior destino foi Paracatu, na região Noroeste.   

Fazendeiro tentou ‘despachar’ trabalhadores após acidente

A fazenda onde aconteceu o acidente que vitimou Renato Alves Brito e outros três colegas é de propriedade de um engenheiro influente no município do Sul de Minas. No dia 13 de julho deste ano, a fiscalização do Ministério do Trabalho chegou a Ilicínea após receber a denúncia do grave acidente ocorrido três dias antes com um trator. Na cidade, encontraram os catadores de café já no centro do município, acompanhados de do irmão do proprietário da fazenda, que tentava os enviar de volta para Porteirinha.

Na propriedade, foi constatado que os quatro trabalhadores estavam vivendo em um alojamento sem água potável e sem camas para todos, que dormiam em colchões velhos e bastante finos. Também não existia armários para colocar os pertences, fornecimento de equipamentos de proteção individual, ou qualquer formalização de contrato de trabalho, sendo que a remuneração ficava retida e eles recebiam apenas pequenos “vales” como “adiantamento da produção”. 

Brito conta que encontrou o “trabalho” por meio de indicação de conhecidos, mas, ao chegar no Sul de Minas, percebeu que não era exatamente o que havia sido “vendido”. “A gente trabalhava e precisava mandar dinheiro para a família, tenho quatro crianças pequenas. Mas era muita enrolação, não via o dinheiro para mandar pra minha esposa comprar comida pros meus filhos. A gente ainda passava dificuldade dentro do próprio trabalho, pedia para comprar as coisas e não traziam. Teve dia que comemos feijão ou arroz puro, chegamos a comer farinha seca. Água a gente bebia de uma mina que desentupimos”, detalha o trabalhador resgatado. 

Ele era quem conduzia o trator na hora do acidente e conta que a marcha quebrou, já que o veículo nunca passava por revisões, descendo uma ladeira descontrolado. “No dia do acidente, quando estava no hospital, o Toninho (irmão do proprietário) foi lá para pedir que eu mentisse aos fiscais, queria que falasse que peguei o trator sem pedir, sendo que foi instrução deles. Quebrei quatro costelas e a coluna, não consigo trabalhar mais e não recebi nada deles, sequer procuraram para saber como estou. Esses fazendeiros só querem o nosso suor, para eles enriquecerem enquanto a gente passa necessidade”, reclama. 

Passado um mês do acidente, o trabalhador ainda aguarda uma decisão judicial para receber pelo trabalho que o deixou acamado, uma vez que o “patrão” se recusou a reconhecer o vínculo empregatício e não fez o pagamento dos valores que eram devidos. “Agradeço muito a Deus e ao Ministério do Trabalho. A fiscalização foi lá e tomou conta da situação, ou eu nem sei o que seria da gente se não fosse eles resgatando a gente”, completa Brito. 

Carlindo Souza Rocha, de 37 anos, também estava entre os trabalhadores que foram traficados de Porteirinha para o Sul de Minas. Ele aproveitou para dar a dica a outros trabalhadores rurais como ele. “Vivemos momentos de pânico e terror lá. Hoje, o que digo para os colegas é: fique atento para não ser vítima de trabalho escravo e, se acontecer, não se omita. Denuncie!”, alerta. As denúncias de trabalho análogo à escravidão podem ser feitas pela internet, no site do SIT.

Para auditor, números de Minas são devido à grande fiscalização

O auditor-fiscal do trabalho e Chefe da Divisão de Fiscalização para Erradicação do Trabalho Escravo do Ministério do Trabalho, Maurício Krepsky, defende que Minas Gerais costuma liderar as estatísticas deste tipo de ocorrência por se tratar do Estado com maior número de ações fiscais.

“O esforço de fiscalização é muito grande e, por isso, há mais problemas encontrados. Temos em Minas auditores com bastante experiência e que já participaram do grupo nacional, além de várias gerências em cidades pequenas. São fiscais com faro técnico apurado para identificar essa questão”, pondera. 

Ainda segundo Krepsky, outro fator que influencia nestes números é que os trabalhadores mineiros são os que mais sabem os canais de denúncia ao Ministério. “Usam muito, isso faz com que fique mais fácil pra gente identificar o local e fiscalizar. Recebemos denúncias dos próprios trabalhadores, pelo site, muito bem feitas, com fotos e vídeos anexados, indícios consistentes e, com isso, conseguimos priorizar e fazer ações assertivas”, finaliza o auditor. (O Tempo)

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