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STF e maconha: julgamento é retomado e placar pela descriminalização do porte está em 5 a 2

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STF e maconha: julgamento é retomado e placar pela descriminalização do porte está em 5 a 2 - Foto: reprodução
STF e maconha: julgamento é retomado e placar pela descriminalização do porte está em 5 a 2 – Foto: reprodução

Depois de idas, vindas e longas pausas causadas por pedidos de vista, o Supremo Tribunal Federal (STF) voltou a julgar nesta quarta-feira (6) a descriminalização do porte de drogas.

Até o momento, foram cinco votos favoráveis e dois contrários à descriminalização da posse de drogas para uso próprio.

No início da sessão desta quarta, tanto Luís Barroso quanto André Mendonça fizeram questão de ressaltar que o julgamento não se trata de uma legalização, mas apenas da descriminalização da posse de maconha para consumo próprio.

André Mendonça começou seu voto sinalizando que acompanhará o ministro Cristiano Zanin, que é contra a descriminalização.

André Mendonça baseou seu voto nos males que podem ser causados pelo uso de maconha, como transtornos psicológicos e seu risco de causar dependência. Ele ainda citou os riscos para os recém-nascidos em casos de mães que usam maconha durante a gravidez.

Mendonça também citou dados de países que legalizaram o uso da cannabis, como Canadá e Uruguai, ao argumentar que o uso da substância aumentou nessas regiões.

Ele citou que a maconha também é a porta de entrada para outras drogas. “É o primeiro passo para o precipício”, disse.

André Mendonça também se mostrou contra o cultivo caseiro para consumo próprio. Ele cita que uma planta, dependendo das condições, pode produzir até 600 gramas de flores secas para serem fumadas.

Em seu voto contrário à descriminalização, ele diz que essa mudança na lei de drogas, “na prática, nós estamos liberando o uso”.

Ele propôs que a diferenciação entre o usuário do traficante seja a partir do porte de 10 gramas da erva. Até então, os ministros tinham sugerido quantidades entre 25 e 60 gramas.

O voto de André Mendonça foi o segundo contrário na retomada do julgamento, após ele fazer um pedido de vista para analisar melhor o caso. Por enquanto, estão a favor: Gilmar Mendes (relator da ação), Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e a ex-ministra Rosa Weber.

Eles argumentaram que o uso da maconha é uma questão de liberdade individual e deve ser combatido com campanhas de informação e atendimento focado na saúde dos usuários.

O julgamento, iniciado em 2015, foi suspenso pela segunda vez no dia 24 de agosto de 2023, após o ministro André Mendonça pedir vista (mais tempo para analisar o caso).

Mas o que esperar da sessão desta quarta? Ela deve encerrar a discussão sobre o porte de cannabis para consumo próprio? Advogados ouvidos pela BBC News Brasil apostam que não.

O próximo a votar será Nunes Marques que, segundo os juristas, deve fazer um novo pedido de vista.

Caso isso ocorra, ele poderá analisar o processo durante mais 90 dias e, só então, o caso poderá ser colocado em pauta novamente pelo presidente da Corte, Luís Roberto Barroso.

Pedido de vista

O doutor em direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP) Arthur Rollo afirma, em entrevista à BBC News Brasil, que a tendência é que Nunes Marques faça um novo pedido de vista. Além disso, o especialista também espera que o ministro use o tempo máximo de 90 dias para estudar o processo.

Ao ser questionado sobre qual deve ser o voto de Nunes Marques, Rollo diz que é difícil saber porque o ministro pode interpretar o caso de duas maneiras possíveis.

“Se ele votar a favor da descriminalização, os defensores das liberdades vão aplaudir, mas os defensores da família não vão gostar. Independente do voto que ele der, ele vai desagradar uma parte do público dele”, diz.

Para o advogado e professor na Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, o ideal seria que o julgamento terminasse ainda nesta quarta para evitar o prolongamento da discussão.

“Esse tema é batido, de domínio público e está sendo tratado no mundo inteiro. Todo mundo já poderia votar nesta quarta e seguir para outro julgamento porque tem muitos temas importantes no Supremo”, diz o advogado.

A professora de direito da FGV Eloísa Machado explica como será a ordem dos ministros a voltarem. Ela diz que o primeiro voto é do relator, no caso o Gilmar Mendes, e depois segue do ministro com menos tempo de casa para o mais velho. O presidente é o último a votar.

“Como a composição do tribunal já mudou várias vezes durante o curso do julgamento, há uma particularidade de ministros mais antigos já terem votado. Flávio Dino, recém empossado, não votará porque sucede, no tribunal, a vaga deixada por Rosa Weber, que já votou”, explica.

Machado, no entanto, prefere não dar um palpite de qual será a posição de Nunes Marques.

A professora explica que qualquer ministro pode pedir vistas após o voto de André Mendonça, “seja para estudar mais o tema antes de votar ou alterar o voto já proferido”.

Advogado e diretor da Reforma, a Rede Jurídica pela Reforma da Política de Drogas, Emílio Figueiredo diz à reportagem que o julgamento não deve acabar tão cedo.

“Acredito que o Nunes Dias não vote hoje e peça vista. Seria uma surpresa muito grata se ele votasse, mas eu acredito que isso não ocorra e ainda há chance do luiz Fux e Toffoli pedirem vista”, diz.

Emílio Figueiredo explica que o julgamento só acaba após todos os ministros votarem, mesmo que a maioria já tenha sido formada.

Uma pesquisa feita pelo Datafolha em setembro de 2023 apontou que 72% dos brasileiros são contra legalizar a maconha no Brasil para uso geral, incluindo o recreativo. Por outro lado, 76% são a favor de legalizar o uso da erva para consumo medicinal.

25 gramas e seis plantas fêmea

Caso o julgamento termine favorável à descriminalização da posse de pequenas quantias de drogas, a Suprema Corte discutirá os parâmetros de quantidade para diferenciar o usuário do traficante. Na visão de defensores dessa medida, pode reduzir o que seriam prisões equivocadas por tráfico no país.

A ação não trata da venda de drogas, que continuará ilegal qualquer que seja o resultado. O crime de porte para consumo já não é punido com pena de prisão no país desde 2006, com a sanção da atual Lei de Drogas.

Caso a descriminalização seja aprovada no STF, a pessoa que portar entorpecentes para consumo próprio não poderá mais ser submetida a outras punições atualmente em vigor, como prestação de serviços à comunidade ou comparecimento a programa ou curso educativo, nem terá um registro na sua ficha criminal.

Apesar disso, estudiosos do tema afirmam que esse julgamento pode ter o impacto de reduzir o número de pessoas presas no país, caso a decisão do STF permita libertar pessoas que estariam, ao seu ver, erroneamente encarceradas por tráfico de drogas.

Para que isso ocorra, dizem, seria necessário que a Corte estabelecesse parâmetros objetivos para diferenciar qual a quantidade de drogas deve ser considerada voltada para consumo e qual deve ser enquadrada como tráfico.

Defensores da medida, como a associação que representa os peritos da Polícia Federal (APCF) e integrantes da Procuradoria-Geral da República, afirmam que a falta de parâmetros objetivos para que policiais, promotores e juízes diferenciem o consumo da venda faz com que muitas pessoas detidas no país com pequenas quantidades de maconha ou cocaína, por exemplo, acabem presas pelo crime de tráfico.

No entanto, há organizações que estão participando do processo que duvidam deste efeito porque discordam da avaliação de que pessoas estejam sendo presas por tráfico equivocadamente.

Barroso e Weber, por exemplo, propuseram 100 gramas de maconha como um corte para diferenciar usuário e traficante. A quantidade segue parâmetros usados em outros países, como Espanha e Holanda.

Já Moraes e Mendes sugeriram 60 gramas, enquanto Zanin defendeu apenas 25 gramas.

Os ministros também discutem fixar uma quantidade máxima de pés de maconha para um usuário cultivar. Luís Roberto Barroso, por exemplo, sugeriu que o usuário possa ter seis plantas fêmeas (aquelas que produzem flores com THC para serem fumadas) em casa.

Os ministros ressaltaram, porém, que eventuais parâmetros a serem adotados serviriam como uma referência básica, podendo o juiz considerar o indivíduo como usuário, mesmo que esteja com quantidade maior, ou ainda enquadrá-lo como traficante, mesmo que tenha quantidade menor. Isso dependerá de outros elementos que corroborem para o crime de tráfico, como apreensão de armas ou balança para pesar drogas, por exemplo.

Fachin, quando votou em 2015, foi contra a adoção de critérios pelo STF, pois considerou que seria função do Congresso definir essa quantidade. Mas ele ainda pode revisar seu voto, como fez Mendes, que também havia ficado contra a fixação de parâmetros no início do julgamento.

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